quinta-feira, 31 de maio de 2012

Viagem a Cuba



Juntei-me a um grupo de 12 pessoas que se dispuseram a passar dez dias em Cuba, com objetivos bastante parecidos. Algo difícil de explicar, porque só quem carrega sentimentos como o que nós levávamos na bagagem poderia entender. O que vimos lá foi o mesmo que registraram as lentes das várias Canon’s e Nikon’s que nos acompanharam. O grupo se dividia entre jornalistas, fotógrafos e documentaristas.

Uma conexão de oito horas em terras panamenhas, após uma viagem de seis, nos permitiu conhecer o centro histórico, e o Canal do Panamá, construído para a travessia de navios entre o Atlântico e o Pacífico. A cidade surpreende pela suntuosidade e pelo desenvolvimento. Vê-se ali um canteiro de obras sobre o qual erguem-se arranhecéus das mais variadas formas. Alguém do grupo a chamou de “Dubai dos trópicos”. Passamos a ter uma ideia do contraste que encontraríamos no nosso próximo destino.

Às 19:30h pousamos no aeroporto Jose Martí, em Havana. Depois de enfrentarmos certa burocracia, entramos oficialmente no país e fomos para um espaço onde se podia trocar euros por CUC (peso cubano), cujo valor equivale ao dólar americano. Dalí se podia ver cubanos, provavelmente moradores de ouros país, sendo recebidos por parentes, em um clima de aparente excitação, talvez por causa do feriado de 1º de maio, data tão importante para eles. Uma coisa que me chamou a atenção foi a quantidade de eletrodomésticos, principalmente TVs de LCD trazidas por essa pessoas. Do lado externo do aeroporto, Audis, Mercedes e BMW’s, novos, trabalhando como taxis, também nos surpreenderam. Contratamos uma Van que nos levou até o Centro da capital. Ali o grupo se dividiu. Eu e mais três companheiros nos hospedamos num casarão, típico de Havana Velha. À noite, um rápido passeio pelas redondezas, um lanche, e cama para descansar de uma jornada de quase 24 horas até nosso sonho.

No dia seguinte, café da manhã e conversa com os cubanos (eles sabem tudo das novelas brasileiras), e outra surpresa: chegaram para se hospedar ali um grupo de jovens americanos. Pela manhã fomos conhecer o Capitólio, Teatro Municipal de Havana, La Floridita e almoço num restaurante ao ar livre, com lagosta, mojito e música tradicional cubana ao vivo (o ponto alto do show foi a minha participação, cantando El Cuarto de Tula – um clássico do Buena Vista Social Club). Após o almoço, contratamos uma kombi para nos levar para a cidade de Varadero, há duas horas de Havana.

Permanecemos por três dias naquele paraíso banhado pelas águas azul turquesa do Mar do Caribe. Ali é possível encontrar turistas do mundo inteiro, e cada vez que algum deles descobria que éramos brasileiros, logo começavam a cantar: “ai seu eu te pego, ai se eu te pego...”. Única decepção que tivemos naquele lugar, embora a comida oferecida pelos hotéis também não sejam muito boa. No dia 30, à tarde, voltamos para Havana na expectativa do desfile de 1º de maio. Hospedamos-nos na casa de uma senhora solteirona de uns 50 anos, tresloucada, bipolar e engraçada. Enquanto o restante do grupo foi cambiar dinheiro no aeroporto, fui sozinho conhecer a Praça da Revolução, onde estão os memoriais à Jose Martí, Camilo Cinfuegos e Che Guevara.

No dia seguinte, levantamos às 6h da manhã e nos encaminhamos ao local onde ocorreria o desfile do Dia do Trabalhador. Ficamos assustados com tanta gente (mais de 1 milhão), e o que mais nos tocou foi o envolvimento da população com as causas socialistas, com a solidariedade dos povos de outros países em relação ao embargo econômico e com a negação ao capitalismo. O restante dos dias foi de turismo pela capital: Museu da Revolução, Malecón, Praça das Armas, Universidad de Havana, bares, restaurantes, livros, charutos, run e música.

A experiência cubana significa uma espécie de passeio pelo tempo, um mergulho na história da América Latina, em sua luta contra a colonização espanhola, da qual surgiram mitos como Simon Bolívar e Jose Martí. É ter contato com um povo que sofre com as agruras de um bloqueio econômico, mas que ainda carrega na cabeça os louros da vitória de uma revolução que derrubou os domínios imperialistas e que mitificou nomes como Fidel Castro, Camilo Cinfuegos, Che Guevara e Raul Castro. Ir a Cuba é ver acesa, ainda, uma pequena chama da Guerra Fria, da Sierra Maestra, de Playa Girón, da Rede Vespa, das lutas da esquerda marxista, de um socialismo que ainda insiste em sobreviver em meio a um capitalismo que ferve ao seu redor. É rever os “áureos” tempos pré-revolucionários dos cassinos, dos carrões da década de 50 e dos cabarés, como o lendário Buena Vista Social Club. É reviver uma época em que a máfia americana, comandada por Al Capone, fechava hotéis cinco estrelas, em Havana, para noitadas regadas a run, charutos, mulheres e shows de Frank Sinatra.

Tomar um daiquirí sentado ao lado da estátua de Ernest Hemingway, em La Floridita, ou um mojito em frente ao mar do Caribe, em Vadero; fumar um autêntico Monte Cristo em La Bodeguita Del Médio; passear em um Ford 1950; assistir o pôr do sol no Malecón; comprar caixas de charutos e run Havana Club, livros e camisetas com um rosto de Che Guevara; hospedar-se na casa de um nativo e conversar com ele por horas ao som de música cubana. Tudo isso só se pode fazer ali. Em Cuba, é possível experimentar os piores papeis higiênicos e a melhor música do planeta, os piores sabonetes e a melhor lagosta, os piores ônibus e a melhor medicina do mundo.

Percebi que tudo o que depende da vontade, de força e do talento daquele povo, eles procuram fazer da melhor maneira possível, o resto foge ao seu controle, já que há um bloqueio internacional imposto pelos EUA que proíbe a comercialização de qualquer produto com Cuba, seja para eles comprem ou venderem. O que posso dizer é que, com todas as dificuldades que enfrentam os habitantes daquela pequena ilha, ele se dignam em dizer que seus índices de mortalidade infantil são menores que dos EUA e que, dos milhões de pessoas que vão dormir essa noite na rua, em todo o mundo, nenhuma é cubana.

terça-feira, 13 de março de 2012

A mulher e sua luta por um espaço na sociedade




Qual é o papel da mulher na sociedade? Esse pergunta merece freqüentar a pauta das principais discussões que recorrem sobre o tema, antes, durante, e depois do “8 de março”. As comemorações, via de regra, recaem sempre em apelos estéticos ou com fins comerciais. Esse paradigma da mulher corpo, da mulher símbolo sexual, “do lar” ou cliente potencial de lojas de roupas e cosméticos, põe em segundo plano a importância da participação da mulher na sociedade, na política, nas ciências, nas artes, na economia e na própria história da humanidade, como nas lutas por liberdade, igualdade e justiça.

O sexo feminino enfrentou séculos de subserviência e de submissão em relação ao homem. Houve um tempo em que a mulher não podia trabalhar, estudar, votar, assumir funções públicas e nem mesmo andar ao lado do homem, talvez, no máximo, um passo atrás. A ela cabia a função de cuidar dos filhos e da casa. Sua serventia não ia além das funções domésticas, de mãe e de esposa, servindo ao marido, do ato de tirar-lhe as botas à obrigação sexual.

Mudar essa situação era o seu grande desafio. Não lhe bastava, portanto, um grito de independência e liberdade contra aquele quem lhe oprimia. Era necessário quebrar uma cultura milenar. Cabia a ela derrubar paradigmas, tabus e estereótipos criados em torno do papel da mulher na sociedade. Para isso precisaria enfrentar uma sociedade machista, uma igreja ultraconservadora e séculos de estagnação social, em meio à qual ela se encontrava subjulgada.

Pode-se dizer que a guerra foi uma grande aliada da mulher nessa independência. Como a composição das forças militares eram cem por cento formada por homens, cabia a elas assumirem funções industriais, inclusive na fabricação de armas e apetrechos bélicos. Estava, portanto, vencida a primeira batalha, que obviamente não ocorreu nos campos de guerra, mas no mercado de trabalho.

E assim as mulheres vêm, aos poucos, conquistando seu espaço na sociedade e tornando-se cada vez mais importante no contexto geral da vida social. O direito de trabalhar, de votar, de candidatar-se e de assumir funções, que antes cabiam exclusivamente aos homens, foram conquistas que as colocaram em seu merecido lugar e que reafirmaram a força do sexo feminino, algo que vai muito mais além do modelo pobre e vulgar que a sociedade insiste em querer lhes atribuir.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

ENCONTRANDO A PAZ NA TERRA DE MILHO VERDE


A relação entre homem e terra existe desde que o homem é homem e que terra é terra. Esse amor aumenta, quando nossos antepassados, meio homem meio macaco, com a terra teve contato. Plantou semente, choveu chuva, virou terra um charco. Colheu-se mandioca, beterraba, jenipapo... Brotou Jujuba, couve-flor, abóbora madura. Criou-se, então, a agricultura.

Revolver a terra, tirar dela o barro, construir moradia, colher o alimento de todo dia. Dos serviços mais básicos e certos à inspiração do poeta que cria e lhe remete versos, tudo nos é dado pela terra. Dos quatro, ela é o primeiro elemento, seguido da água que é rio, do fogo que é calor e do ar que é vento. Terra é montanha, é firmamento, planeta. Terra molhada é boa, terra sem chuva é seca. Terra é mãe, é avó. Terra é chão, é pó. Pó que viemos e ao qual voltaremos.

Mas de repente tudo mudou na cabeça da gente. Namoro do homem com a terra acabou. Solo macio ficou duro, escuro. Asfaltou. Charrete virou auto. Rua de terra virou asfalto. Tudo sem graça. Poesia sem rima. Minhoca por baixo, carro por cima. O verde apagou, ficou cinza. A mata ficou que é concreto só. Uma tristeza de dar dó. Prédio agora é “mato”. Gente por cima, gente por baixo... O rio ficou triste e chato. Sujeira das fábricas, esgoto dos vasos. A chuva que entrava na terra e nascia em nascente, agora enche em enchente. Mata gente. O canto do bem-te-vi já não há, é buzina daqui, sirene de lá. O ar não dá pra respirar. Vizinhos não conhecem uns aos outros. Cisma-se com tudo, desconfia-se de todos.
Oh natureza, onde está sua cor, sua beleza, sua paz, seu sabor?

Procuro daqui e dali. Inda hei de achar. Parto em busca de ti. Devorando o horizonte cheguei ao alto daquele monte. E você lá estava, linda como esperava encontrar. Pura e original. As matas em seu verde, o rio em seu caudal. Um pequeno paraíso chamado Milho Verde, cidade, vila ou arraial. Nesse lugar água se bebe na mina, fruta se come no pé, ar puro se respira e oração se reza com fé.

Cama lá é rede, rua é de terra, grama é tapete, fechadura é cancela. Lá, vizinho se conhece, conversa, versa. Tudo se resolve num dedo de prosa. Gado é no pasto, milho é na roça. Pinga é da boa, cigarro é de palha. Má notícia não se espalha. Folia de reis, moda de viola... Isso pra acabar não tem hora. O que não falta é assunto. Ali se bebe, dança e tem comida pra todo mundo. Tudo se aproveita. Da fruta e da folha faz-se uma receita. Cabaça pequena vira cumbuca, se é grande vira cuia. A pinga vai pra goela, a reza pro santo e o mau agouro prá’s cucuia. Barro vira panela, lenha vira fogo, bambu vira pinguela. Cerca é besteira, planta-se um pé de tomate, uma trepadeira... Cipó vira corda. Cavalo se monta, porco se engorda. Conta lá não se anota: Ou se tem honra pra comprar a prazo ou se tem dinheiro pra pagar com nota.

Tudo isso é lá em Milho Verde, o paraíso que flerta com o céu, enquanto Deus responde ao flerte: Vê-se esse amor no pôr do sol, no nascer da lua. O vento brinca com os galhos, o universo se insinua... Passarinho lança voou... Moça olha na janela... Cachoeira ora é água ora é pedra. O sol pensa que é verão, as flores que é primavera. Gerações vêm e vão, mas lá o tempo espera. É paz que não termina. Amor do homem com a terra parece enraizado, vivo como água da mina, firme como árvore de jatobá. Tudo isso se vê por lá. Quero voltar a milho verde, deitar-me na rede numa noite de luar. Rever as estrelas, aqueles olhosinhos de Deus que são mais numerosos ali que em qualquer outro lugar.