A relação entre homem e terra existe desde que o homem é homem e que terra é terra. Esse amor aumenta, quando nossos antepassados, meio homem meio macaco, com a terra teve contato. Plantou semente, choveu chuva, virou terra um charco. Colheu-se mandioca, beterraba, jenipapo... Brotou Jujuba, couve-flor, abóbora madura. Criou-se, então, a agricultura.
Revolver a terra, tirar dela o barro, construir moradia, colher o alimento de todo dia. Dos serviços mais básicos e certos à inspiração do poeta que cria e lhe remete versos, tudo nos é dado pela terra. Dos quatro, ela é o primeiro elemento, seguido da água que é rio, do fogo que é calor e do ar que é vento. Terra é montanha, é firmamento, planeta. Terra molhada é boa, terra sem chuva é seca. Terra é mãe, é avó. Terra é chão, é pó. Pó que viemos e ao qual voltaremos.
Mas de repente tudo mudou na cabeça da gente. Namoro do homem com a terra acabou. Solo macio ficou duro, escuro. Asfaltou. Charrete virou auto. Rua de terra virou asfalto. Tudo sem graça. Poesia sem rima. Minhoca por baixo, carro por cima. O verde apagou, ficou cinza. A mata ficou que é concreto só. Uma tristeza de dar dó. Prédio agora é “mato”. Gente por cima, gente por baixo... O rio ficou triste e chato. Sujeira das fábricas, esgoto dos vasos. A chuva que entrava na terra e nascia em nascente, agora enche em enchente. Mata gente. O canto do bem-te-vi já não há, é buzina daqui, sirene de lá. O ar não dá pra respirar. Vizinhos não conhecem uns aos outros. Cisma-se com tudo, desconfia-se de todos.
Oh natureza, onde está sua cor, sua beleza, sua paz, seu sabor?
Procuro daqui e dali. Inda hei de achar. Parto em busca de ti. Devorando o horizonte cheguei ao alto daquele monte. E você lá estava, linda como esperava encontrar. Pura e original. As matas em seu verde, o rio em seu caudal. Um pequeno paraíso chamado Milho Verde, cidade, vila ou arraial. Nesse lugar água se bebe na mina, fruta se come no pé, ar puro se respira e oração se reza com fé.
Cama lá é rede, rua é de terra, grama é tapete, fechadura é cancela. Lá, vizinho se conhece, conversa, versa. Tudo se resolve num dedo de prosa. Gado é no pasto, milho é na roça. Pinga é da boa, cigarro é de palha. Má notícia não se espalha. Folia de reis, moda de viola... Isso pra acabar não tem hora. O que não falta é assunto. Ali se bebe, dança e tem comida pra todo mundo. Tudo se aproveita. Da fruta e da folha faz-se uma receita. Cabaça pequena vira cumbuca, se é grande vira cuia. A pinga vai pra goela, a reza pro santo e o mau agouro prá’s cucuia. Barro vira panela, lenha vira fogo, bambu vira pinguela. Cerca é besteira, planta-se um pé de tomate, uma trepadeira... Cipó vira corda. Cavalo se monta, porco se engorda. Conta lá não se anota: Ou se tem honra pra comprar a prazo ou se tem dinheiro pra pagar com nota.
Tudo isso é lá em Milho Verde, o paraíso que flerta com o céu, enquanto Deus responde ao flerte: Vê-se esse amor no pôr do sol, no nascer da lua. O vento brinca com os galhos, o universo se insinua... Passarinho lança voou... Moça olha na janela... Cachoeira ora é água ora é pedra. O sol pensa que é verão, as flores que é primavera. Gerações vêm e vão, mas lá o tempo espera. É paz que não termina. Amor do homem com a terra parece enraizado, vivo como água da mina, firme como árvore de jatobá. Tudo isso se vê por lá. Quero voltar a milho verde, deitar-me na rede numa noite de luar. Rever as estrelas, aqueles olhosinhos de Deus que são mais numerosos ali que em qualquer outro lugar.
2 comentários:
o cotidiano faz com que os humanos pensem apenas em si e esqueça das belezas naturais da vida.
Infelizmente é o que tem ocorrido nos últimos anos, Amanda. Milho Verde é um lugar que ainda nos inspira e nos faz enxergar a vida de outra maneira. Volte sempre!
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