A eleição para presidente dos Estados Unidos deste ano entrou para a história, não apenas pela vitória de Barack Obama, um nome pedido pelo mundo inteiro, mas pelo valor simbólico que ela representa. Se ele será capaz de mudar os rumos da política e da economia americanas, conduzida até aqui por caminhos tortuosos, isto é outra história. O simples fato da eleição de Obama já é uma revolução no enraizado conceito cultural da América, que se nega a abandonar o velho e ultrapassado “modo de vida americano”.
O jargão usado pela campanha de Obama, marcado pela afirmação: “Sim, Nós podemos”, foi o mesmo usado por Martin Luther King, há 40 anos, na sua famosa luta pelos direitos civis dos negros. E é nele, acredito, que está descrita toda a simbologia deste fato de relevante valor cultural e histórico. O que pode ser ilustrado também pelo celebrado voto daquela senhora de 106 anos de idade, que tempos atrás não tinha direito ao voto por ser mulher e “negra”, e que hoje foi às urnas para eleger um presidente que lhe assemelha na cor e na origem.
Os fatores simbólicos que dão peso à vitória de Obama podem ser explicados nas seguintes indagações: É possível o país, considerado um dos mais racistas do mundo, eleger um presidente negro? É possível uma nação capitalista eleger um candidato com tendências socialistas? É possível que um povo tido como tradicional e conservador, eleger um presidente de origem negra e com idéias inovadoras, como pôr fim às guerras do Iraque e Afeganistão, dialogar com Cuba e Venezuela e diminuir a emissão de gás carbônico? Sim, é possível. Foi isso o que mostrou o resultado das urnas, que não só deu a vitória ao democrata, mas também uma esmagadora maioria a seu favor no parlamento.
Os resultados das eleições americanas suscitaram um sopro de esperança no planeta, tanto do ponto de vista econômico, como também político e ambiental. Depois de dois mandatos catastróficos de um presidente conservador, prepotente e inculto, que só fez aumentar o anti-americanismo no mundo, eis que há uma chance para novas propostas. O povo americano, dessa vez, apostou na possibilidade da mudança.
Mas nem tudo serão flores para o novo presidente, fora o clima de otimismo que tomou conta do mundo inteiro por causa da sua eleição, Barack Obama herdará a nação mais poderosa do mundo com uma economia em ruínas, com uma divida interna gigantesca e em meio a duas guerras. Um desafio e tanto e um terreno vasto para quem quer fazer uma revolução de verdade num país que lhe deu crédito para isso.
Surpreendentemente o escritor brasileiro Monteiro Lobato parecia prever isso, quando em 1926 lançou o livro O Presidente Negro, uma obra de ficção cujo roteiro percorre a história a partir de uma máquina do tempo criada por um dos seus personagens. Por meio dela descobriu-se que no ano de 2228 ocorreria a campanha para eleger o 88º Presidente dos Estados Unidos. Nela disputavam entre si um candidato branco e uma candidata do sexo feminino. Como os afro-descendentes eram maioria no montante da população, ambos os candidatos esperavam contar com o apoio do líder negro Jim Roy – Algo como um Luther King dos anos 2228. - É chegado o dia das eleições e o negros, numa atitude surpreendente, votaram, não nos dois candidatos, mas em seu próprio líder.
A vida imita a arte. Esse fato foi lembrado pelo escritor Roberto Pompeu de Toledo em matéria publicada na revista Piauí, de outubro. O livro, apesar de apresentar idéias racistas, defendendo, inclusive, a eugenia, algo que, de certa forma, representava o pensamento do seu autor, mostra a visão futurista e profética de Monteiro Lobato.
Embora estejamos atravessando um dos momentos mais difíceis da economia mundial, as esperanças de mudanças dão novo fôlego na luta por dias melhores, ainda mais quando essas escolhas foram feitas pelo povo. Querer mudar já é meio caminho andado para que a mudança realmente ocorra. O êxito dela vai depender da qualidade dessas escolhas, e é nisso que a comunidade mundial tem apostado.
Texto: Luciano Soares
Nenhum comentário:
Postar um comentário