quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Perguntas do momento sobre questões seculares


A suspensão da Festa do Rosário, assim como o cancelamento de outros eventos por causa do avanço da gripe suína no município, foi uma medida, eu diria cabível, diante da situação do crescente número de casos confirmados em Oliveira, conforme dados do Comitê de Enfrentamento da Gripe.

No entanto, a situação mudou quando a justiça, por liminar, autorizou a realização de um evento público na cidade, nesse caso o Campeonato de Muares no Parque de Exposições de Oliveira. Abrindo exceção para um, mesmo a cidade estando em Estado de Emergência, baixado pelo prefeito, foi inevitável que as perguntas começassem a surgir: Porque não autorizar os outros eventos públicos também? Bom, nesse caso o prefeito eximiu-se da responsabilidade, já que lhe tiraram as rédeas das mãos, uma vez que ordem judicial não se discute, cumpre-se.

Valendo-se do direito da livre manifestação, do acesso à cultura, ao lazer e à livre crença religiosa, que lhe garante a Constituição Federal, o congado também foi ao poder judiciário e conseguiu, em segunda instância, uma liminar autorizando a realização da Festa do Rosário em Oliveira. Justiça feita, eis que tem início uma das mais tradicionais manifestações culturais e religiosas do Estado.

Vencidas as primeiras barreiras, é hora de enfrentar situações às quais os congadeiros aprenderam a encarar desde os tempos da escravidão. Absurdos que o mais pessimista dos negros talvez possa não ter imaginado que chegaria ao século XXI. Mas para quem teve as portas das igrejas fechadas, e que, por causa disso, construiu a sua própria igreja e que, posteriormente, viu essa capela ser demolida para em seu lugar ser construída a Catedral de Oliveira, templo este que também fechou suas portas aos congadeiros, o resto é fichinha.

O caso é que, com a autorização nas mãos, o Boi do Rosário ganha as ruas e atrai, como sempre, uma multidão de seguidores. Anunciante da Festa do Rosário, o boi também se configura numa das mais tradicionais expressões culturais da cidade, embora haja pessoas que não o enxerga como tal. Ao chegar à Praça XV, a multidão, e o Boi, encontraram o logradouro às escuras. Apagaram-lhe as luzes. Mas nada que lhe tirasse o brilho inato da sua missão de anunciar a grande Festa que estava por começar. Como se não bastassem as luzes apagadas, fecharam as portas dos banheiros públicos. Para completar, lá no largo da matriz, onde foi montado o palco para receber os reis e as rainhas, via-se no seu entorno, a velha matriz e a Casa da Cultura com suas portas fechadas.

Tudo isso é só uma constatação de que pouca coisa mudou desde o período da escravidão. Vê-se que pouco se alterou desde o tempo em que a sociedade possuía carta “branca” para hostilizar os negros recém libertados, numa época em que o aparato social não poderia servir a manifestações de origem africana.
Diante de tudo isso surgem as perguntas: Por que não foram liberados os R$15 mil aprovados pela câmara para ajuda à Festa do Rosário? Por que as luzes não foram acesas num importante momento em que a praça poderia fazer jus à sua reforma e à sua própria razão de ser? Por que os banheiros estavam fechados? Por que a Casa da Cultura não abre suas portas àquela que para mim é mais importante manifestação cultural dessa cidade? Por que a Catedral não lhes abre as portas, já que foi construída no lugar da pequena capela de Nossa Senhora do Rosário, erguida por mãos negras?

Se há uma resposta para tudo isso, certamente ela servirá a dois séculos pregressos, e provavelmente responderá a questões, tais como: Por que os negros continuam metidos nas favelas, com pouco acesso aos bens materiais e intelectuais, o que deveria ser um direito de todos, sem distinção?

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