segunda-feira, 14 de julho de 2008

Uma história colombiana

Para nenhum Botero ou García Márquez botar defeito. O plano de libertação da ex-candidata à presidência da Colômbia, Ingrid Betancourt, refém das Farc durante seis anos, foi considerado perfeito do ponto de vista estratégico-militar. Para seus familiares e amigos, um alívio. Porém, olhando do prisma político, algumas perguntas começam a surgir: Porque só agora resolveram tomar a iniciativa do resgate? Por que a ex-senadora precisou sofrer durante seis anos nas mãos dos guerrilheiros, sem ter esperança de ser libertada, já que o presidente colombiano não aceitava negociar com as Farc. Durante o cativeiro, a família da ex-candidata à presidencia criticou o presidente Uribe por rejeitar as principais exigências do grupo rebelde e optar pela via militar para resolver o problema.

Em 2002, Ingrid, que tem dupla cidadania (colombiana e francesa), disputou o poder contra Uribe, e embora não estivesse bem nas pesquisas era um nome forte. Em 1998 quando concorreu ao cargo de senadora foi a candidata mais votada nas eleições daquele ano. Ao ser seqüestrada pelas Farc criou-se um mito em torno do seu nome e a sua libertação foi pedida por líderes de vários países. Essa pressão mundial principalmente sobre o governo colombiano aumentou desde que foram divulgadas imagens da ex-senadora no cativeiro com uma aparência abatida e doentia.

Em meio a esse cenário, começaram a surgir alguns personagens para a história que se seguiria: De um lado as Farc, que sempre foi uma pedra nos sapatos dos presidentes colombianos, mais ainda de Uribe, que teve o pai assassinado por elas. Esse grupo rebelde ganhou notoriedade internacional. Chegou a reunir um contingente de dez mil soldados, e criou um clima de terror na Colômbia ao adotar o seqüestro como estratégia de negociação. De outro lado aparece o nome de Ingrid Betancourt, ex-senadora seqüestrada pelo grupo guerrilheiro. E por último, Álvaro Uribe, que se elegeu presidente da Colômbia em 2002 e adotou um posicionamento político diferente da maioria dos países da América Latina, alinhando-se política e militarmente com os Estados Unidos.

Até então esses personagens não tinham entrado em conflito direto, mas eis que surge uma quarta peça: Hugo Chaves. Pressionado pela comunidade internacional Álvaro Uribe autoriza o presidente da Venezuela a negociar com as Farc. Chaves consegue a libertação de três reféns, entre eles, da ex-assessora de Ingrid Betancourt, Clara Rojas. O presidente venezuelano, crítico ferrenho dos EUA, saiu com o moral alto na história, e a possível libertação de outros reféns, de Ingrid inclusive, seria só uma questão de tempo.

Caso isso ocorresse pelas mãos de Chaves, o presidente colombiano teria dois problemas: O primeiro deles seria pelo fato de o seu governo sair desmoralizado por não ter conseguido resolver um problema interno, e o segundo se faria a partir da libertação de Ingrid, que sairia como heroína e forte candidata a presidência da Colômbia. Isso certamente frustraria os planos de um terceiro mandato de Uribe. Era preciso, portanto, mudar essa situação. Isso implicaria em tirar Chaves da jogada, libertar Ingrid de alguma forma e receber os louros pelo êxito da missão.

A partir daí os EUA entraram no jogo e uma série de iniciativas foi tomada, entre elas a invasão do espaço aéreo equatoriano, o bombardeio de um acampamento das Farc impossibilidades novas negociações, e a ventilação de uma notícia de que no computador de um líder guerrilheiro teria informações sobre a ligação do presidente venezuelano com os rebeldes. Isso foi suficiente para tirar Chaves da jogada. Cumprida a primeira parte do plano era hora de bolar uma operação de resgate. Melhor manter o sigilo sobre ela, caso alguma coisa desse errado Chaves se fortaleceria novamente.

Mas o plano saiu perfeito, Ingrid foi resgatada de forma espetacular e Uribe foi aplaudido e elogiado pela comunidade internacional. Fala-se num terceiro mandato e seu nome subiu consideravelmente nas pesquisas de intenção de voto. Ingrid saiu traumatizada e fazendo campanha, não por sua possível candidatura, mas pela libertação dos outros reféns, Chaves ficou apagado e as Farc fragilizadas e desmoralizadas.

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