Luis Nassif avaliou a cobertura política da mídia. - Foto Luciano Soares |
Juca Kfouri, João Rodarte e Domingos Meirelles falam sobre ética na profissão. - Foto Luciano Soares |
Os jornalistas Luciano Soares e
Domingos Meirelles, durante encontro em Tiradentes.
Foi realizado nos dias 13 e 14 de
novembro, na Pousada Brisa da Serra, em Tiradentes, o 1º Encontro de
Jornalistas, com nomes de peso da imprensa nacional, como Audálio Dantas (ex-presidente
da Federação Nacional dos Jornalistas - FENAJ), Luis Nassif (Dinheiro Vivo),
Marcelo Beraba (O Estado de S.Paulo), Domingos Meirelles (TV Record), Vera
Guimarães (Folha de S.Paulo), Juca Kfouri (Folha de S.Paulo, UOL e CBN), Richard Rytenband (Record News), Miriam
Leitão (Globo / CBN), José Paulo Kupfer (O Estado de S.Paulo), entre outros, com
o objetivo de debater os caminhos do jornalismo no Brasil. A política, a ética,
a crise e a tragédia de Mariana estiveram na pauta dos debates.
O evento foi divido em quatro
mesas, que debateram temas como Política, Ética, Economia e os destinos do
jornalismo. Na primeira delas, Luis Nassif, Marcelo Beraba e Heron Guimarães,
do jornal O Tempo, mediados por Gustavo César de Oliveira, da Revista Viver
Brasil, debateram a cobertura política dentro da atual conjuntura do país. Nassif
foi contundente ao criticar o controle político das redações e a falta de
isenção nas coberturas, que estariam sendo usadas como instrumentos políticos. O
jornalista deu o exemplo da abordagem que a imprensa tem dado à situação
política do país, priorizando ataques ao Partido dos Trabalhadores (PT) e
livrando outros partidos e políticos, como Aécio Neves, um dos principais nomes
da oposição ao governo federal.
Como exemplo, Nassif disse que o
Ministério Público Federal, por meio do procurador geral, não endossou uma
denúncia vinda do doleiro Alberto Youssef, em relação a Furnas: “Você tinha
detalhes: 150 mil dólares, que ia através da Bauruense (empresa fornecedora de
Furnas) para a conta da irmã do Aécio. Tem na gaveta do procurador geral, desde
2010, um inquérito do Rio de Janeiro de uma conta offshore (aberta em paraíso fiscal) tendo como beneficiários o Aécio
e familiares. Você pergunta: por que é que não entrou nisso? (...) Então,
quando você tem todo o foco num partido só, você está interferindo
politicamente, você está desequilibrando o jogo político”, ponderou ele.
Sobre a cobertura da crise, José
Paulo Kupfer disse que o pensamento mais conservador domina 85% das fontes
ouvidas nas editorias de economia dos maiores jornais do Brasil (Estadão, Folha
de S. Paulo e O Globo). “É uma cobertura parcial. De um lado só. A economia não
é uma ciência exata. A política econômica menos ainda, mas os saberes e as
visões, e a maneira de encarar os fenômenos econômicos têm viés, tem lado. A
gente não está cumprindo direito essa função de mostrar os dois lados, para que
o leitor, o telespectador ou internauta possa ter uma visão integrada e mais
abrangente do que está acontecendo na cobertura de economia”, disse Kupfer.
Para Domingos Meirelles,
presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), o quadro de
intolerância, do ponto de vista do controle da informação, existe. Para ele, o maior
combate que se trava hoje não é só no Iraque, na Síria, nem no Afeganistão, mas
também aqueles que ocorrem, silenciosamente, nos fechamentos das redações,
sejam de mídia impressa e de televisão. “Quando a gente fala muito em ética e
moral são, na verdade, conceitos um pouco elásticos para um determinado padrão
de realidade – e no caso, estamos discutindo o ambiente jornalístico – isso não
significa que nós sejamos obrigados a abrir mão dos nossos valores, dos nossos
princípios, e nos submeter às diretrizes, ao calendário ou à liturgia de cada
jornal”, afirmou Meirelles.
Para Juca Kfouri, não existe um
decálogo da ética, “até porque, a ética varia”. “A ética não é a mesma em tempo
de guerra e em tempo de paz. Como não é própria a ética de quem está cobrindo (o
fato) em tempos de guerra e em tempos de paz”, falou ele. Juca leu um texto do
jornalista Cláudio Abramo, segundo o qual “o jornalista não tem ética própria.
Isso é um mito. A ética do jornalista é a ética do cidadão: o que é ruim para o
cidadão, é ruim para o jornalista”. (...) “É evidente que o jornalista tem
lado. E não deve esconder isso do seu leitor. O que o lado dele não pode é
contaminar a cobertura que ele faça de um fato”, concluiu Kfouri.
Sobre a tragédia ocorrida em
Mariana, José Paulo Kupfer disse que jornalismo falhou ao não prevê-la. “A
função dele (do jornalismo) não é ficar procurando todas as mazelas que possam
existir ou que possam vir a acontecer, mas a função dele é estar preocupado com
esses assuntos e tentar mostrar e denunciar o que possa acontecer. (...) Não é
possível que uma situação que levou a isso não fosse conhecida de algum
ecólogo, de algum cientista ou de algum pesquisador e que os jornalistas não
tenham tido essa questão como pauta, para tentar antecipar a tragédia”, avaliou
ele.
Miriam Leitão disse estar
encontrando dificuldade para realizar o trabalho jornalístico sobre a tragédia,
dada a indignação que o fato teria provocado nela. A jornalista disse que
esteve no local para conhecer um projeto do fotógrafo Sebastião Salgado, por
meio do qual se busca recuperar nascentes de água, que a teria enchido de
otimismo, até o desastre acontecer. “Eu saí dessa matéria sonhando com a vida,
e nesses últimos dias, estou vendo morte do Vale, do meu Vale, do Vale onde eu
nasci”, disse Miriam, que é mineira de Caratinga, município localizado na
região do Vale do Rio Doce.
O jornalista Luciano Soares,
editor da revista Viva Bem e editor-adjunto da GAZETA DE MINAS, participou do
encontro e fez suas considerações sobre o evento: “Foi um momento importante
para o jornalismo brasileiro. Uma oportunidade dele encarar a si mesmo, de fazer
autocríticas e expor questões que ocorrem no dia-a-dia, mas que não são
colocadas em debates. O
interessante é que ali estavam os profissionais de comunicação que estão na
linha de frente da imprensa brasileira, ou seja, os verdadeiros operários da
notícia. E pelo que foi exposto, nem todos estão de acordo com o que tem
ocorrido nas redações e nas coberturas jornalísticas, que, por sua vez, têm
seguido por caminhos tortuosos, traçados por interesses econômicos e políticos.
A mídia brasileira vive uma crise de credibilidade, denunciada diuturnamente
nas redes sociais. É o momento de repensar o jornalismo e de estabelecer novos
rumos, do contrário, ele se auto-exterminará, ao persistir em erros que parece
não querer corrigir, cedendo às pressões do mercado e da política, em
detrimento da boa informação”.
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