quarta-feira, 18 de novembro de 2015

7 DE SETEMBRO: UMA HISTÓRIA MAL CONTADA



Quais os passos que um homem precisa dar para tornar uma nação independente? O primeiro é amar a liberdade. O segundo é desobedecer ao rei. Assim o fez Joaquim José da Silva Xavier, o alferes, conhecido como Tiradentes, líder de um movimento denominado Inconfidência Mineira (inconfidência quer dizer falta de fidelidade ao rei), que lançou-se à luta, movido por boas doses de revolta, amor à liberdade e desobediência civil. A partir dele e de seus companheiros, Minas Gerais dá os primeiros passos para tornar o Brasil independente de Portugal.

Na época, o movimento foi deflagrado e seus líderes foram presos e enviados para o Rio de Janeiro. Todos negaram participação, menos Tiradentes, que assumiu sua liderança. Após decreto de dona Maria I, é revogada a pena de morte dos inconfidentes, exceto a de Tiradentes, o inconfidente de mais baixa condição social. Sua cabeça foi cortada e levada para Vila Rica. O corpo foi esquartejado e espalhado pelos caminhos de Minas Gerais.

Mataram a flor, mas não detiveram a primavera. Nove anos depois, iniciava-se na Bahia a Revolta dos Alfaiates, também chamada de Conjuração Baiana, cujas causas eram a proclamação de uma república no Brasil e a abolição da escravatura. O movimento baiano também foi controlado pelo governo e suas lideranças populares executadas por enforcamento, enquanto os membros mais abastados foram absolvidos.

Outros movimentos de emancipação continuaram a acontecer pelo país, como a Conjuração do Rio de Janeiro, em 1794, a Conspiração dos Suaçunas em Pernambuco (1801) e a Revolução Pernambucana de 1817.
Todas essas revoltas, apesar de contidas, foram determinantes para enfraquecer o colonialismo e impor objetivos republicanos. A partir delas, constata-se e reafirma-se a tese de muitos historiadores de que a independência do Brasil não se resume ao Grito do Ipiranga, ilustrado pelo famoso quadro de Pedro Américo, quando Dom Pedro I, com a espada em ao alto, bradou “Independência ou Morte!”.

Fatos que poucos sabem

Além dessas, há outras nuances importantes a serem consideradas sobre a independência do Brasil, uma delas reside na abertura dos portos, em 1808, quando foi rompido o pacto colonial e atendidos os interesses da elite agrária brasileira, que passou a estabelecer uma relação comercial de peso com a Inglaterra.
Quando dom João VI retornou para Portugal, ocorreu uma aproximação do seu filho dom Pedro com a aristocracia rural brasileira, que aproveitou da oportunidade para encaminhar a independência do Brasil, com o cuidado de não afetar seus privilégios, entre eles, o latifúndio e escravismo. Dessa forma, a independência foi imposta verticalmente. Para os ruralistas, era necessário o fim da colônia, mas, ao mesmo tempo, essa mudança não poderia ganhar um caráter revolucionário, como aquele que marcou a libertação dos países da América do Sul do domínio espanhol, já que isso, evidentemente, ameaçaria seus privilégios.

A já formada burguesia brasileira, composta por aristocratas, monarcas e políticos, tenta convencer dom Pedro a permanecer no Brasil, já que a sua partida poderia significar a perda das rédeas do país e até redundar numa guerra civil. Um trecho do Hino à Independência remete a isso: “Ressoavam sombras tristes da cruel Guerra Civil, mas fugiram, apressadas, vendo o Anjo do Brasil”. De acordo com Laurentino Gomes, em seu livro 1822, o medo de uma rebelião dos cativos assombrava a minoria branca como um pesadelo. “O isolamento e as rivalidades entre as diversas províncias prenunciavam uma guerra civil, que poderia resultar na fragmentação territorial, a exemplo do que já ocorria nas colônias espanholas vizinhas”, escreveu Gomes.

Um abaixo assinado de oito mil assinaturas foi levado por José Clemente Pereira (presidente do Senado) a dom Pedro, em 9 de janeiro de 1822, solicitando sua permanência. Cedendo às pressões, dom Pedro decidiu-se: "Como é para o bem de todos e felicidade geral da nação, estou pronto. Diga ao povo que fico".

Para boa parte dos historiadores, dom Pedro decidiu ficar bem menos pelo povo e bem mais pela aristocracia, que o apoiaria como imperador, desde que a futura independência não alterasse a realidade sócio-econômica colonial. Ainda no livro “1822”, Laurentino lembra que na véspera de sua independência, de cada três brasileiros, dois eram escravos, negros forros, mulatos, índios ou mestiços. Os analfabetos somavam 99% da população. Os ricos eram poucos e, com raras exceções, ignorantes.

Em 13 de maio de 1822, a maçonaria e o Senado concedem a dom Pedro o título de Defensor Perpétuo do Brasil. Em 3 de junho foi convocada uma Assembléia Geral Constituinte e Legislativa, e em primeiro de agosto, considerou-se inimigas as tropas portuguesas que tentassem desembarcar no Brasil. A essa altura, diante da sequência de fatos revoltosos, Portugal ameaça enviar tropas, caso o príncipe não retornasse imediatamente.

Problemas intestinais

Ainda na obra de Laurentino Gomes, o autor conta que no dia 7 de setembro de 1822, Dom Pedro, já às margens do riacho Ipiranga, em São Paulo, sofria com dor de barriga, provavelmente causada por um alimento mal conservado que havia consumido. Por causa disso, vez por outra, precisava apear da “bela besta baia”, como a descreveu um padre que o acompanhava, bem diferente do “fogoso alazão” da tela de Pedro Américo, para alivia-se no “denso matagal que cobria a margem da estrada”. Mas isso não o impediu de bradar o famoso “Independência ou morte! Estamos separados de Portugal".

Já no Rio de Janeiro, em 14 de setembro de 1822, Dom Pedro foi aclamado Imperador Constitucional do Brasil e o país se tornava independente de Portugal.

As bases sócio-econômicas, como o trabalho escravo, a monocultura e o latifúndio, que representavam a manutenção dos privilégios da aristocracia, permaneceram inalteradas.
(Fontes: Livro 1822, de Laurentino Gomes; Histórianet.)

*Por Luciano Soares.

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